sexta-feira, 15 de janeiro de 2016

Salve Guayasamin


De forma crua e linda, Guayasamin esfrega na cara de quem tenha olhos, que na morte não existem escolhidos, apenas mortos.
Ao retirar do quadro "La Pieta" de Avignon as figuras da igreja, Guayasamin traz a terra a dor de uma morte, independente de quem seja a figura central.
O foco da cena deixa de ser a figura de um cristo escolhido e condenado a ser um salvador. O foco é a morte de um homem que pode ser qualquer um, qualquer mulher, de qualquer idade ou condição.
O quadro não mais fala da morte de um desconhecido longínquo que fez algo que deveríamos enaltecer, fala da morte da pessoa ao lado, quase carne nossa.
Quem morre está nu, entregue e liberto. Roupas, máscaras e acessórios já são totalmente desnecessários. O sofrimento para ele termina, mas o que será que se inicia?
O morto descansa, passeia, faz jornada, ou simplesmente vira pó. De qualquer forma, para ele, a dor já não existe.
Ela existe para nós, que ainda teimamos em não aceitar a inevitabilidade das coisas, as quais ainda acreditamos que controlamos e que essa morte simplesmente nos escapou, foi um acidente de percurso.
A dor as vezes parece uma entidade, ela nos persegue, chega pequenina parecendo apenas mais um peso que devemos suportar, e então cresce, toma espaços, gruda e em tantas vezes nos submete.
Na morte, dói a falta do cheiro, do jeito e do olhar, dói a falta do presente e do futuro que deixa de existir.
A morte de um é a morte de todos e de ninguém!